COMO CONSTRUIR UM CIDADE SUSTENTÁVEL?
Pesquisas conduzidas pelas Nações Unidas mostraram que as cidades consomem 78% da energia do mundo, ao mesmo tempo em que geram mais de 60% do total de gases de efeito estufa. De fato, um estudo recente revelou que 20% da produção total de dióxido de carbono do globo vem de apenas 100 das 13.000 cidades analisadas. A maior parte dessas emissões pode ser atribuída ao mau planejamento urbano, o resultado inevitável de projetar nossas cidades para carros em vez de seres humanos. Se não fizermos nada, as ameaças representadas pela rápida urbanização só se tornarão mais assustadoras nos próximos anos.
Agora, mais da metade da população humana da Terra vive em cidades. Até o ano de 2050, espera-se que esse número chegue a 70%, com cerca de 2,5 bilhões de habitantes adicionais da cidade contribuindo com ainda mais emissões para a já enorme pegada de carbono produzida pela urbanização moderna.
Então, o que podemos fazer? Esta é a pergunta de um bilhão de reais. Uma resposta possível é que devemos mudar drasticamente a forma como imaginamos, projetamos, criamos e operamos os ambientes urbanos de amanhã. Se desejar-mos sobreviver e prosperar em nosso planeta em constante mudança, devemos construir cidades mais sustentáveis.
AFINAL O QUE É UMA CIDADE SUSTENTÁVEL?
Uma cidade sustentável – também chamada de “cidade verde” ou “eco-cidade” – é um espaço urbano cujo projeto, construção e operação priorizam a preservação do meio ambiente ao lado da saúde e bem-estar econômico, social e físico dos seus habitantes.
As cidades sustentáveis precisam ter uma visão de longo prazo, minimizando os danos à ecologia local e criando espaços urbanos compactos e resilientes que fornecerão abrigo para muitas gerações futuras. Questões de uso do solo, biodiversidade, conservação, bem como a limpeza do ar e da água são cuidadosamente considerados nas cidades sustentáveis, que também visam promover conexões entre as pessoas e fortalecer as comunidades por meio de um desenho urbano planejado.
No contexto das atuais mudanças climáticas, as cidades sustentáveis também devem ser capazes de se adaptarem a um planeta em constante mudança e resistir a eventos climáticos extremos, como enchentes, incêndios florestais e furacões. Isso provavelmente não será surpresa, mas lembrando de que a maioria das nossas cidades modernas não são sustentáveis.
Se as cidades sustentáveis podem ser caracterizadas por verticalidade, compactação, alta densidade, caminhabilidade, economia diversificada, redes robustas de transporte público e proteção ambiental, então infelizmente a maioria das cidades modernas incorporam exatamente o oposto dessas características. Destruindo e urbanizando descuidadamente ecossistemas preciosos, as cidades de hoje são constítuidas por subúrbios de baixa densidade populacional que se espalham sempre para fora de seu centro. Construídas para carros em vez de pedestres, as megalópoles dominadas por favelas da era moderna são labirintos impenetráveis de distritos financeiros e comerciais que isolam comunidades, isolam vizinhos de vizinhos e nos separam da natureza.
CONCEITO DE CIDADE VERDE: COMO SERIA UMA CIDADE SUSTENTÁVEL?
Vamos imaginar uma cidade entrelaçada com uma vegetação exuberante. Onde se locomover é simplesmente uma questão de abrir a porta da frente e começar a andar. Praças ao ar livre se fundem com as ruas, avenidas largas e movimentadas repletas de pedestres e ciclistas.
Acabaram-se os gases sufocantes e o engarrafamento do tráfego interminável de veículos. Automóveis não são permitidos dentro dos limites desta cidade ou, se forem, estão restritos a apenas determinadas áreas. Proibir carros pode parecer estranho, até impossível, mas já é uma realidade em partes de Londres. Um bairro vibrante se mistura ao próximo, todos acessíveis a pé, ciclovia ou onibus elétrico.
Todos os edifícios são certificados pelo LEED e muitos são feitos quase inteiramente de plástico reciclado, concreto verde ou até mesmo madeira de origem local e colhida de forma renovável. Toda a energia da cidade vem de fontes renováveis de emissão zero. As bombas de calor geotérmicas fornecem ar quente e frio. Os arranha-céus extraem energia de turbinas que cobrem seus telhados ou giram diligentemente em parques eólicos offshore visíveis à distância.
Se você quiser percorrer uma longa distância ou sair da cidade para uma região vizinha, basta dar um passeio até um dos muitos pontos de integração de transporte público e subir em um trem de alta velocidade que o levará pelas florestas verdejantes, pradarias, pântanos, e pastagens agrárias que cercam sua casa metropolitana. Quando você chega ao seu destino, você simplesmente se levanta e continua andando para onde seus pés o levarem.
POR QUE DEVEMOS CONSTRUIR CIDADES SUSTENTÁVEIS?
Sob esse aspecto, as eco-cidades podem soar como utopias melancólicas, mas irreais, semelhantes às megaestruturas ambientalistas de uma era arquitetônica passada. As cidades sustentáveis não são apenas alcançáveis, elas são críticas para nossa sobrevivência.
BENEFÍCIOS DAS CIDADES SUSTENTÁVEIS
Antes de nos aprofundarmos nos passos que podemos tomar para nos aproximarmos de um futuro urbano mais verde, vamos dar uma olhada em alguns dos argumentos sobre por que devemos levar essa ideia a sério.
• Ambiental
O principal fator por trás das cidades sustentáveis é a necessidade de proteger o mundo natural e a nós mesmo junto com ele. Eventos como os incêndios florestais fora de controle no Pantanal Matogrossense nos últimos anos revelaram o preço destrutivo exigido por nosso modo de vida industrializado e urbano. Os relatórios da ONU sobre as Mudanças Climáticas deixa claro que, a menos que tomemos medidas drásticas nos próximos anos, os danos ambientais piorarão além do previsto e vastas áreas do planeta se tornarão inóspitas a qualquer forma de vida por centenas, senão milhares de anos. Precisamos fazer tudo o que pudermos para evitar esse resultado. Se construirmos e modernizarmos as cidades para conservar massa de terra, extrair energia de energia renovável e limitar o uso de automóveis, isso por si só poderia reduzir seriamente as emissões de carbono e nos colocar em um caminho melhor e mais sustentável.
• Comunidade
Cidades sustentáveis exigem compactação e construção ascendente consciente em uma pegada menor, de modo a diminuir o impacto nos ecossistemas circundantes. Aproximar os destinos, é uma solução mais simples e elegante do que montar uma nova frota de carros elétricos e de coletores solares necessários para alimentá-los. Essa escolha de design é impulsionada tanto por fatores sociais quanto ambientais. A abordagem da sustentabilidade exige a criação de bairros de renda mista caminháveis, perfeitamente misturados com compras locais e espaços públicos abertos. Esses tipos de comunidades em “escala humana” promovem mobilidade, interação social, interconectividade e aprimoram a paisagem urbana com bolsões de caráter e sabor únicos. Desta forma, as cidades sustentáveis não são apenas mais amigas do ambiente. Elas também são mais amigáveis com as pessoas.
• Saúde Mental e Física
As cidades sustentáveis são inerentemente mais caminháveis devido aos princípios ambientais e centrados na comunidade em seu núcleo. Uma pesquisa recente mostrou que, daqueles que identificam sua comunidade como caminhável, 57% descreveram sua qualidade de vida como “alta”. As pessoas que vivem em cidades caminháveis também fazem mais exercícios diários e, portanto, experimentam um maior grau de saúde cardiovascular. O aumento da caminhabilidade requer menos veículos na estrada, o que significa menos poluição, o que significa ar mais limpo e respirável. As cidades sustentáveis também incentivam a interconectividade. Pesquisas mostram que pessoas que se sentem mais conectadas umas com as outras apresentam taxas mais baixas de ansiedade e depressão.
Por outro lado, viver nas cidades mal projetadas de hoje está associado a um aumento de quase 40% nos transtornos de humor e a um aumento de mais de 20% nos transtornos de ansiedade, o que dobra o risco de esquizofrenia e abuso no uso de substâncias tóxicas. No entanto, um crescente campo da ciência revelou que o acesso à natureza pode transformar essa dinâmica negativa em positiva. Estudos recentes mostraram que pessoas que passam apenas duas horas em contato com a natureza por semana relatam níveis mais altos de bem-estar em comparação com aquelas que não o fazem. Cidades sustentáveis podem resolver essa necessidade premente abrindo e permeando o ambiente urbano com o natural na forma de orlas, parques, trilhas e áreas verdes intocadas.
CARACTERÍSTICAS DAS CIDADES SUSTENTÁVEIS: O Papel da Natureza
Cidades sustentáveis não apenas preservam a natureza; elas também extraem força disso. Já abordamos como o acesso à natureza pode melhorar o bem-estar dos habitantes de uma cidade. Agora vamos dar uma olhada em apenas algumas das outras maneiras que a natureza pode melhorar a vida na cidade.
• Redução de calor
Nos meses de verão, as cidades se transformam em fornos de concreto espessos com o calor pungente. Dependendo da cidade, as temperaturas podem ser de 1 a 7 graus mais quentes durante o dia e 2 a 5 graus mais quentes à noite. Chamadas “ilhas de calor urbanas” são resultado de vários fatores, incluindo a densidade populacional e a concentração de materiais de superfície que absorvem e ampliam o calor como aço, vidro e concreto. Este problema só vai piorar à medida que encaramos um aumento da temperatura global de mais de 1,5 graus Celsius nos próximos anos. Uma maneira de vencer o calor é cultivar copas de árvores na estrutura urbana. Pode parecer básico para nossas mentalidades orientadas para a tecnologia, mas algo tão simples quanto a sombra das árvores é extremamente benéfico.
• Produção de alimentos
É praxe na mentalidade dos brasileiros que a comida vem de fazendas em áreas rurais. Mas a insegurança alimentar global forçou uma mudança tectônica nas últimas décadas. Um dos resultados mais marcantes é o chamado “agrihood” (bairro agrícola). São bolsões no ambiente urbano e suburbano onde as comunidades se organizam em torno do cultivo de frutas e vegetais frescos. Na cidade de São Paulo estão surgindo fazendas urbanas e hortas comunitárias dentro das fronteiras da cidade, fornecendo alimentos frescos aos moradores da cidade. Esse modelo pode e deve ser replicado nas cidades sustentáveis de amanhã.
• Diminuição de enchentes
A mudança climática está trazendo consigo uma ampla gama de eventos climáticos extremos. Enquanto algumas áreas serão sufocadas pela seca, outras serão afogadas pela chuva. As inundações tornaram-se cada vez mais desastrosas nos últimos anos. Uma resposta típica vista nas cidades é escorar edifícios vulneráveis e orlas do centro com muros de contenção de concreto. Embora essas soluções sejam necessárias, elas são incompletas e ignoram um aliado crítico: a própria natureza. As áreas com pastagens e zonas húmidas saudáveis estão melhor protegidas das inundações. Essas áreas absorvem as águas pluviais e ajudam a limpá-las de poluentes. Ao preservar os pântanos na periferia, as cidades protegem um ecossistema vital e, ao mesmo tempo, protegem-se dos efeitos catastróficos do aumento das águas.
Ao converter 10% das terras agrícolas em pradarias, podemos reduzir o escoamento das águas superficiais em até 40%. Essa estratégia não precisa se aplicar apenas às paisagens agrícolas, no entanto. Dentro da cidade sustentável, terras e campos abandonados podem ser semeados com flores nativas e gramíneas que enriquecem o solo e criam um amortecedor contra inundações.
• O Futuro das Cidades Sustentáveis
O futuro das cidades sustentáveis depende inteiramente da seriedade com que enfrentamos as ameaças das mudanças climáticas e vivemos em renovada harmonia com a Terra. Há razões para ser otimista. As Nações Unidas e, talvez mais significativamente o Banco Mundial, destacaram o desenvolvimento sustentável como uma prioridade fundamental nos últimos anos. Além disso, muitas cidades, estados e nações estão tomando a iniciativa.
Não é suficiente, projetar centros urbanos verdes ou parques empresariais ecologicamente corretos. Devemos adotar uma estratégia coerente que integre todas as formas de habitação humana em um todo mais verde, mais unido e orientado para o trânsito. Para que o planeta prospere, os velhos padrões de crescimento construídos sobre os princípios industriais de centralização, especialização e padronização terão que evoluir para novas formas – formas que substituirão os gestos simbólicos e estilos modernos da arquitetura moderna por projetos que honram o clima, a ecologia e a história.
